EMDR: O que acontece no cérebro?

 

O Que Acontece no Cérebro Durante a EMDR

A terapia de Dessensibilização e Reprocessamento por Movimentos Oculares (EMDR) é uma abordagem psicoterapêutica usada para tratar pacientes com transtornos relacionados a traumas, como o Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT). Ela se baseia na premissa de que os movimentos oculares podem ajudar a processar e integrar memórias traumáticas. Embora ainda haja muitas perguntas sobre os mecanismos exatos do EMDR, pesquisas têm explorado o que acontece no cérebro durante essa terapia.

A Teoria do Processamento Adaptativo de Informações

A EMDR é fundamentada na Teoria do Processamento Adaptativo de Informações, que sugere que o cérebro armazena memórias de eventos traumáticos de maneira disfuncional. Essas memórias mal processadas podem ficar presas em redes neurais específicas, o que pode causar respostas emocionais negativas quando desencadeadas. A técnica de EMDR visa reprocessar essas memórias, facilitando o seu armazenamento de forma mais adaptativa e menos perturbadora.

Fases da EMDR e Suas Implicações Neurais

A terapia EMDR é dividida em oito fases, cada uma com implicações específicas no cérebro do paciente.

1. Anamnese e Planejamento do Tratamento: Durante esta fase, o terapeuta avalia a história do paciente e identifica memórias traumáticas específicas que precisam ser tratadas. Esta fase é essencial para o mapeamento do plano terapêutico e tem menos impacto direto no funcionamento cerebral, servindo mais como preparação.

2. Preparação: O terapeuta prepara o paciente para a terapia, explicando o processo e garantindo que ele esteja confortável com o método. Aqui, as redes neurais associadas à ansiedade e ao estresse podem começar a se acalmar, à medida que o paciente compreende o que esperar e como participar ativamente do processo.

3. Avaliação: Nesta fase, o paciente é convidado a identificar imagens, pensamentos e sensações associados ao evento traumático. Este processo ativa as redes neurais que armazenam essas memórias, colocando-as temporariamente em foco para reprocessamento.

4. Dessensibilização: Durante a dessensibilização, o terapeuta usa estímulos bilaterais, como movimentos oculares guiados, batidas ou sons alternados, enquanto o paciente se concentra nas memórias traumáticas. Estudos de neuroimagem sugerem que esses movimentos oculares podem reduzir a atividade no sistema límbico, incluindo a amígdala, que é responsável por respostas emocionais intensas. Essa redução da ativação emocional permite que o paciente experimente a memória com menos angústia, facilitando o reprocessamento.

5. Instalação: Após a dessensibilização, o terapeuta trabalha para fortalecer associações positivas com a memória tratada, incentivando o paciente a pensar em uma crença positiva que ele deseja associar à experiência. Isso pode envolver a ativação de circuitos cerebrais relacionados a memórias positivas e o reforço de conexões sinápticas que promovem uma visão mais saudável e adaptativa da memória traumática.

6. Escaneamento Corporal: O paciente é então solicitado a prestar atenção a quaisquer sensações físicas restantes associadas à memória traumática. Este processo de conscientização corporal ajuda a integrar a experiência emocional com as respostas fisiológicas, promovendo uma maior coerência entre mente e corpo.

7. Encerramento: Durante o encerramento, o terapeuta assegura que o paciente retorne a um estado emocional estável, utilizando técnicas de relaxamento e autocontrole emocional. Isso ajuda a estabilizar as redes neurais ativadas e reforça a capacidade do paciente de lidar com possíveis desconfortos futuros.

8. Reavaliação: Na sessão seguinte, o terapeuta revisa o progresso do paciente, avaliando a eficácia do tratamento em relação à memória processada. Este processo de reavaliação pode ativar novamente as redes neurais para consolidar as mudanças adaptativas e avaliar a necessidade de mais intervenção.

Mecanismos Cerebrais da EMDR

Os mecanismos exatos pelos quais a EMDR influencia o cérebro ainda não são completamente compreendidos, mas várias teorias foram propostas com base em pesquisas científicas:

Redução da Ativação da Amígdala

A amígdala é uma estrutura cerebral crítica para o processamento emocional, especialmente em resposta ao medo e ao estresse. Durante a terapia EMDR, os movimentos oculares parecem atenuar a resposta hiperativa da amígdala às memórias traumáticas, o que pode explicar a redução das reações emocionais intensas.

Ativação do Córtex Pré-frontal

O córtex pré-frontal, responsável por funções cognitivas superiores como tomada de decisão e regulação emocional, é ativado durante a EMDR. Essa ativação pode permitir que o paciente reavalie e reinterprete a memória traumática de maneira mais lógica e menos emocional, promovendo uma resposta mais adaptativa.

Estimulação Bilateral e Hemisférios Cerebrais

A estimulação bilateral, um componente central da EMDR, pode ajudar na comunicação entre os hemisférios cerebrais. Esse processo facilita o acesso a diferentes redes neurais, permitindo uma integração mais abrangente das memórias traumáticas com outras experiências e informações armazenadas no cérebro.

Efeitos Neurobiológicos a Longo Prazo

A pesquisa sobre os efeitos de longo prazo da EMDR sugere que essa terapia pode levar a mudanças duradouras na estrutura e função cerebral. Por exemplo, a redução da ativação da amígdala e o aumento da conectividade no córtex pré-frontal podem resultar em uma menor reatividade emocional a gatilhos relacionados ao trauma. Além disso, a melhora na comunicação entre os hemisférios cerebrais pode facilitar a resolução de outros problemas emocionais e cognitivos.

Evidências Clínicas 

Estudos clínicos têm demonstrado que a EMDR é eficaz no tratamento de TEPT e outras condições relacionadas ao trauma. Pacientes relatam uma diminuição nos sintomas de ansiedade, depressão e flashbacks após o tratamento. Embora a compreensão completa dos mecanismos cerebrais do EMDR ainda esteja em desenvolvimento, as evidências sugerem que ele promove um reprocessamento adaptativo das memórias traumáticas, levando a uma melhor integração emocional e cognitiva.

A EMDR parece atuar em várias áreas do cérebro, facilitando a dessensibilização de memórias traumáticas e a promoção de uma resposta emocional mais equilibrada. A continuidade da pesquisa nesta área promete esclarecer ainda mais os processos neurológicos subjacentes a essa forma inovadora de terapia, expandindo suas aplicações potenciais no campo da psicoterapia.

Ricardo Santana, Neuropsicólogo, CRP15 0190, (82)99988.3001, Maceió/AL

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